Por Michele Esposito - Houve um tempo, breve e ilusório, em que uma parte da diplomacia ocidental olhou para Ismail Haniyeh como uma possível ponte para o diálogo com o Hamas. Depois de o partido islâmico ter vencido as eleições de 2006, o dirigente foi nomeado pelo presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP), Mahmoud Abbas, como primeiro-ministro de um governo de união nacional na Cisjordânia e na Faixa de Gaza.
Haniyeh era um fundamentalista, porém mais aberto ao diálogo do que outros líderes. No entanto, a convivência com Abbas durou somente alguns meses. Em junho de 2007, o Hamas assumiu o controle de Gaza, expulsando o Fatah, partido moderado do presidente da ANP, e desencadeando uma batalha sangrenta e fratricida. O governo foi dissolvido, e o dirigente rapidamente deslizou para posições extremistas que o levaram a ser definido pelos EUA como "um terrorista global".
Haniyeh nasceu há 62 anos, no campo de refugiados de Shati, em Gaza. Ele era filho de um pescador e, depois de estudar nas escolas da Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina (Unrwa), formou-se em literatura árabe na Universidade de Gaza. Sua entrada no Hamas remonta à Primeira Intifada, no fim da década de 1980, período em que ele foi preso diversas vezes por Israel.
Já nos anos 1990, foi forçado ao exílio no sul do Líbano e regressou a Gaza depois de um ano, iniciando uma ascensão política que o levaria a tornar-se o braço direito do xeque Ahmed Yassin, fundador do Hamas. Quando Yassin foi assassinado por Israel, em 2004, um triunvirato liderado por Haniyeh assumiu o comando da organização. Em 2006, foi apontado como primeiro-ministro da ANP e, após a batalha com o Fatah, decidiu ficar na Faixa de Gaza.
Haniyeh Intensificou os laços com o grupo xiita libanês Hezbollah, a Turquia e o Catar, mas sobretudo com o Irã, de onde, em 2022, afirmou ter recebido recursos militares no valor de US$ 70 milhões. Ele foi acusado pelas chancelarias ocidentais de desviar constantemente a ajuda humanitária aos palestinos para a compra de armas.
Em 2017, foi nomeado chefe político do Hamas e deixou Gaza nas mãos de Yahya Sinwar, líder militar e operacional que acentuou a natureza terrorista das ações da organização.
Haniyeh, que se mudou para o Catar, transformou-se no rosto das relações externas do grupo, viajando constantemente entre Cairo, Doha, Teerã, Beirute e Ancara. Sempre assumiu a responsabilidade pela luta armada e, em 2018, o Departamento de Estado dos EUA o incluiu na lista de terroristas.
A sua nova função, aliada às fotos que o mostravam em locais luxuosos enquanto Gaza sofria com fome, fez com que Haniyeh perdesse a aura de homem do povo. Nunca ficou claro quem, entre Haniyeh e Sinwar, tinha a última palavra sobre as decisões do Hamas nos últimos anos, mas analistas acreditam que o segundo prevaleceu, inclusive nos atentados de 7 de outubro e nas repetidas interrupções de negociações para um cessar-fogo.
Haniyeh, no entanto, nunca abdicou do seu papel de tecelão do eixo da Resistência, dizendo-se ao mesmo tempo disponível para um cessar-fogo caso Israel se retirasse de Gaza.
Em 10 de abril, as bombas israelenses mataram três de seus filhos e quatro netos na Faixa, e Haniyeh reagiu tirando a poeira do fundamentalismo e afirmando que "todo o nosso povo e todas as famílias de Gaza pagaram um alto preço em sangue". "E eu sou um deles", disse o dirigente na ocasião. As últimas imagens que circulam no X mostram Haniyeh em Teerã, na cerimônia de posse do presidente Masoud Pezeshkian e cercado por guarda-costas que nada puderam fazer contra o ataque noturno de Israel. .