Em livro, Ligia Costa afirma que confiança, compaixão e altruísmo são habilidades para a nova liderança em prol de ambientes corporativos mais sustentáveis
Ludimila Honorato
"Chegamos ao auge da desconexão, da falta de significado e da superficialidade nos ambientes corporativos." É diante desse cenário um tanto desolador que a empresária, professora e mentora Ligia Costa afirma ser necessário ter líderes humanizados, cada vez mais voltados para o outro e mais doadores de si. Essa descrição feita por ela mesma está na introdução do livro Líder Humano Gera Resultados, de sua autoria, que é lançado neste mês pelo selo Autoridade, da Editora Gente.
Na obra, Ligia Costa, fundadora da consultoria Thank God It's Today aponta que o perfil de uma liderança compassiva compreende cinco dimensões: humanidade, inclusão, coragem, compaixão e presença. Para chegar a esse modelo, ela destaca que o indivíduo precisa desenvolver qualidade de atenção, orientação para o outro e estar a serviço das pessoas. Isso não implica, porém, em se anular e ser o tipo de líder que aceita tudo.
"Esse líder altruísta, colaborativo, bonzinho não significa que ele não busca resultados e deseja obter sucesso dentro dos novos conceitos", afirma. "O líder empático, que é capaz de escutar o outro, vai demitir alguém também, mas por uma perspectiva em que ele se coloca no papel de humano igual, porque um dia pode ser ele", completa.
O processo de transformação da liderança é longo e compreende aspectos subjetivos e intangíveis, o que, segundo Ligia, cria certa resistência. Porém, os benefícios pessoais e corporativos falam mais alto e justificam a necessidade de uma nova postura. É sobre isso, com cases reais a partir de um trabalho que ela desenvolve há mais de sete anos, que a autora fala no livro, já em pré-lançamento e que estará disponível nas livrarias a partir de 6 de outubro.
Em conversa com o Estadão, Ligia falou mais sobre como ser uma liderança humana em tempos de distanciamento físico e quais habilidades são essenciais. Confira abaixo.
Você coloca que o líder humano é altruísta, compassivo, se doa, transcende o 'eu'. Como fazer isso sem se anular como ser humano e sem parecer que aceita tudo?
Não é algo simples. É um processo de transformação e ampliação de consciência, porque esse líder altruísta, colaborativo, bonzinho, não significa que ele não busca resultados e deseja obter sucesso dentro dos novos conceitos. O que eu trago é exatamente que existe uma ruptura e um novo formato de gestão.
Você pode, sim, ser aquele líder retrógrado, antigo, comandar e controlar a todos, mas o que a gente vê é que os resultados obtidos nesse estilo de liderança são tóxicos e estão causando burnout, estresse e ansiedade. Ou a gente pode fazer uma mudança e ter esse líder empático, colaborativo, que lidera por inspiração e confiança. Hoje, a gente tem pesquisas que comprovam que equipes lideradas por esses profissionais, que fomentam um espaço psicologicamente seguro, têm alta performance.
O líder empático (ouça Ligia falar no podcast abaixo sobre empatia), que é capaz de escutar o outro, vai demitir alguém também, mas por uma perspectiva em que ele se coloca no papel de humano igual, porque pode ser um dia ele. O principal benefício é incluir a emoção como parte integrante do ser humano. Por muitos anos, nós fomos robôs, existia esse distanciamento, e quando a gente compreende que a emoção contribui para as tomadas de decisão, inclusive as duras, isso gera resultado financeiro, de diversidade, inclusão e de soma.
Esse processo não é simples, mas é uma escolha diária de mudança de comportamento através do desenvolvimento de novas habilidades, da repetição de novos hábitos e de práticas de meditação integradas, longas e dedicadas para que isso seja efetivo. São processos de mudança no nosso cérebro, treinos mentais que vão contribuir para a gente resgatar um pouco dessas habilidades do ser humano, que é um ser social e empático por natureza.
Quais habilidades você destaca que um líder precisa desenvolver para ter uma condução mais humana?
A primeira delas que coloco no livro é conscientizar sobre a humanidade compartilhada. O líder é um ser humano antes de ser líder, é um indivíduo independente de cargo, salário, condições sociais, escolhas religiosas, é um ser humano que tem dores, sofrimentos, emoções, sentimentos, desejos, ideais, sonhos. É um ser humano exatamente igual ao outro, é ser capaz de enxergar similaridade no outro. O segundo passo é a presença, estar 100% presente, viver o hoje, o agora, consciente de si, das emoções, cabeça e pé no mesmo lugar e minimizar todos os fatores de comparações com outros, reclamação o tempo inteiro, competição.
O terceiro passo é a coragem de ser quem realmente é, alinhado com seus valores, com aquilo que realmente traz o máximo das suas habilidades e do seu potencial criativo para que isso te motive a trazer a sua criatividade máxima para onde você estiver, aquilo que você realmente tem de expressão e autenticidade para inspirar confiança nos outros e liderar pelo exemplo.
Também trago a habilidade da inclusão, porque eu digo que a empatia já veio com a gente, mas a gente esqueceu. A partir do momento que a reativo a partir de alguns treinos mentais, sou capaz de sentir o que o outro sente, mas acho que a gente já passou dessa etapa e o líder humano inclui o outro, compreende as necessidades diversas para que o outro se sinta pertencendo àquele ambiente.
Em seguida eu trago a habilidade de interconexão, que vai um pouco além dos cinco sentidos e compreende sincronicidade, energia, entende que a física quântica está presente nos nossos ambientes, tem integração das inteligências física, mental, espiritual, financeira para o ser estar 100% presente.
E a última habilidade é da compaixão, que é quando o líder se coloca apto a servir. Hoje, a gente entende que é parte de um todo maior, estamos interconectados, somos sistemas vivos e a serviço de um objetivo maior. E só esse líder humano vai ser capaz de atuar nessas empresas do momento presente em que se fala de ESG, porque esse líder tem o olhar do ambiente, da sustentabilidade, da governança e das pessoas para poder atuar com essa mentalidade ampliada.
Isso parece uma cadeia que o líder segue até chegar ao ponto de se doar. É mais fácil quando a liderança tem essa autoconsciência para depois entender o outro?
Sim. São etapas que a gente percorre e não só as etapas de crescimento e maturidade do indivíduo. Se eu coloco para crianças essa permissão para serem autoconscientes e treino pequenas atividades de gentileza - e gentileza e oferecer bondade são hábitos da compaixão -, essa pessoa cresce dessa forma e vai fazer parte dela esse altruísmo egoísta, como o Dalai Lama acha, que é quando me coloco a disposição para fazer o bem, que faz querer fazer cada vez mais o bem. São práticas, hábitos treináveis que desenvolvem, através dessa autoconsciência, esse indivíduo mais compassivo.
Na pandemia, a gestão passou a ser a distância. Como deixar essa humanidade transparecer por meio de telas, textos e áudios?
Aqui está a maior oportunidade que existe, porque todos foram para casa, se distanciaram fisicamente e relações que eram apenas pró-forma vão se distanciar ainda mais. O colaborador que está em casa, se ele não enxergar algum valor motivacional ou sincronicidade com relação à liderança, ou seja, um líder que gera confiança e exemplo, ele vai desplugar. Esse líder, que de certa forma era só tarefeiro, mandava atividades e nem olhava para o seu funcionário, agora precisa estabelecer uma relação de confiança para não perder o funcionário.
Existe essa habilidade da confiança que precisa ser construída - e só é construída com escuta, quando entendo e me coloco à disposição para servir o meu funcionário de acordo com as necessidades deles. Então, perguntas sobre família, sobre como você se sente, como você está, escutas que antes a gente não fazia, faz com que essa relação de confiança seja construída, senão vai afastar. O perfil do funcionário também vai mudar. Se ele não tiver essa mentalidade intraempreendedora, essa proatividade, se não assumir posições em outras frentes, estiver atento, também vai perder a posição. Essa proatividade é de ambos os lados, gestor e equipe.
Na proposta de transformar o modo de liderar, você traz elementos intangíveis e sempre destaca o amor. Essa visão tem sido encarada com naturalidade ou você ainda encontra resistência?
Eu encontro muita dificuldade exatamente por ser intangível e a grande massa da liderança no Brasil ainda está focada apenas no resultado. Mas os números hoje em dia de afastamento por saúde mental, do desequilíbrio de mulheres em posições de liderança, essa falta de equidade, tudo impacta na crise que a gente vivencia hoje.
O que eu trago é uma solução para essa crise, porque a gente já tem pesquisas científicas, mas a grande dificuldade está no 'de dentro para fora', porque as pessoas estão o tempo inteiro buscando soluções no externo e, pela primeira vez, a solução está dentro. Para minimizar as questões relacionadas à saúde mental, eu preciso ter líderes conscientes que vão fazer projetos de prevenção, que vão construir equipes psicologicamente seguras, e tudo isso é intangível, mas os números começam a trazer o quão é importante a mudança do indivíduo, deste líder que está no topo, para promover ambiente mais sustentável e de alta performance sustentável, no médio e longo prazos.
Serviço
Líder Humano Gera Resultados: como ser um líder que transcende o eu e faz a equipe e a empresa crescerem
Autora: Ligia Costa