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Freiras são indiciadas por suspeita de racismo, maus tratos e tortura no RS

Publicada em 29/09/21 às 20:27h - 131 visualizações

por TV Jundiai Hoje


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Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil  (Foto: TV Jundiai Hoje)
O caso veio a público esta semana. Os episódios que basearam o indiciamento teriam ocorrido entre 2018 e 2019

A Polícia Civil do Rio Grande do Sul indiciou duas freiras por denúncias envolvendo maus tratos, racismo e tortura em um lar para idosas, o Lar das Vovozinhas, na cidade de Santa Maria, na região central do estado, no final de agosto. O caso veio a público esta semana. Os episódios que basearam o indiciamento teriam ocorrido entre 2018 e 2019. A instituição afirma que a congregação delas tinha um contrato com o lar e que as duas religiosas foram afastadas das atividades em 2019.

O caso foi denunciado inicialmente ao Ministério Público do Rio Grande do Sul por uma funcionária do lugar e confirmado por outros trabalhadores. A Promotoria começou a apurar episódios de maus tratos e, em seguida, encaminhou à Polícia Civil para abertura de inquérito policial.

Segundo a delegada responsável, Débora Dias, a investigação conseguiu indícios para basear o indiciamento e identificar quatro vítimas. Uma das freiras foi indiciada por racismo e tortura, e a outra por maus tratos contra duas moradoras. A polícia ouviu familiares, vítimas, funcionários e ex-funcionários. “Esses são os que conseguimos constatar. Toda prova é testemunhal. Não foi um depoimento, foram vários no mesmo sentido”, afirma a delegada.

O episódio de racismo, envolvendo uma moradora do lar, mulher negra, teria ocorrido durante um evento com a participação da comunidade externa. “Segundo mais de uma pessoa, [a vítima] contou que a indiciada disse que ela não iria participar porque era negra, que ela não tinha que se misturar com brancos. Ficou claro que ela foi impedida do convívio social pela cor da pele”, afirma a delegada. Ela não quis entrar em maiores detalhes para evitar constrangimento à vítima, mas confirma que os relatos falam que teriam sido usadas expressões como “negra fedorenta” e “negra suja”.

O crime de tortura teria supostamente ocorrido quando a mesma freira deixou uma idosa trancada em um banheiro nua, por mais de uma hora, em um dia frio. A atitude, de acordo com os depoimentos, era uma forma de castigar a mulher que teria esquecido a chave dentro do quarto trancado mais de uma vez. “Essa conduta é exatamente submeter a pessoa a sofrimento físico e mental intenso. Ela foi retirada do banheiro por outra pessoa”, afirma a delegada.

Já os casos de maus tratos, supostamente praticados pela outra freira, teriam ocorrido no atendimento a idosas, com depoimentos apontado que ela deixava de usar sedativos em alguns tratamentos e a prática de suturação de escaras, ferimentos que aparecem quando a pessoa fica muito tempo em uma mesma posição, o que seria um procedimento inadequado. Foram identificadas duas vítimas. “Como as indiciadas são religiosas isso tem uma conotação mais grave ainda, porque são pessoas que se tem como espiritualizadas, que teriam mais empatia com o ser humano em geral”, diz a delegada.

Ao Ministério Público, foi relatado ainda o episódio de uma cadeirante que teria sido derrubada da cadeira de rodas com um jato d’água. A polícia, porém, diz que não encontrou indícios suficientes para incluir o caso no indiciamento. “Inicialmente a gente fica um pouco desconfiado, poderia ser uma animosidade entre funcionários e as irmãs, mas as declarações foram se repetindo, a prova foi sendo reforçada nesse sentido. O tratamento legal submete a todos da mesma forma”, afirma o promotor Fernando Barros, que recebeu as denúncias iniciais.

As freiras não foram ouvidas até o momento. Segundo o advogado Humberto Ramos Zweibrücker, que faz parte da defesa de ambas, as duas têm 59 e 76 anos. Ele diz ainda que as religiosas se utilizaram do direito constitucional de permanecer em silêncio e devem falar ao juízo.

“Em que pese o indiciamento por parte da autoridade policial, a defesa demonstrará em eventual processo e à luz do contraditório de ampla defesa que as irmãs indiciadas jamais cometeram ou cometeriam quaisquer condutas criminosas”, afirma. As denúncias foram levadas ao Ministério Público por uma funcionária da instituição após o episódio da idosa que foi deixada no banheiro, o que ela considerou como a gota d’água.

A funcionária, que pediu para não ser identificada, contou à reportagem que recebia queixas das idosas há algum tempo e que a mulher castigada tremia, chorava e não falava direito no dia do ocorrido. Ela procurou a direção pedindo algum tipo de atitude, alegando que não poderia ser conivente.

A funcionária conta ainda que chegou a sofrer ameaças e pressão depois de ter feito a denúncia. As religiosas deixaram o trabalho no lar em 2019, depois de aberta sindicância, e não há outras freiras trabalhando no local desde então. A funcionária diz ainda que, hoje, o que é relatado pelas idosas costuma ser investigado em seguida.

O Lar das Vovozinhas foi fundado em 1946, atende cerca de 130 mulheres e é considerado um dos maiores asilos do Brasil, de acordo com informações do próprio site da instituição. Ele se mantém com receitas do BPC (Benefício de Prestação Continuada) das moradoras, doações e ações pontuais para angariar fundos, como brechós.

A vice-presidente do lar, Liliane Mello Duarte, voluntária, diz que as idosas atendidas ali são mulheres vulneráveis e mais da metade delas não têm ninguém. “A gente vê esse caso como um episódio isolado, que foi investigado e dado as medidas que a direção da época achou cabíveis. Ele corre na Justiça, que é a quem cabe julgar”, afirma.

“Cada vez que esse assunto vem à tona, nossas doações caem a zero. Isso é um passado que não existe mais. A gente continua com idosas aqui que precisam de comida, fraldas, fisioterapia, e dentro de uma pandemia em que elas estão trancafiadas, tristes”.



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